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  • Por Roque Tomazeli

O gol da Floresta

A pauta para os alunos da disciplina de Projeto Experimental I do Curso de Ciências da Comunicação – Habilitação em Jornalismo – da Unisinos era sobre futebol e comunicação. A razão do tema tinha a ver com a proximidade da Copa do Mundo de 1998, na França.

Para cumprir a missão produzi, segundo narrativa de Antonio (Macaco) Gonçalves da Silva para mim anos antes, e com a maior fidelidade possível aos fatos, o texto “O gol da Floresta”.

Vinte anos depois publico a matéria, com breve edição, no Repórter Gramado. Uma contribuição para manter presente uma passagem marcante da vida de Antonio Gonçalves da Silva e sua Rádio Floresta, que merecem um lugar na história da comunicação social de Gramado.

O GOL DA FLORESTA

A primeira experiência radiofônica realizada em Gramado ocorreu em fevereiro de 1962 (algumas publicações retroagem os fatos a 1961). Antônio Macaco, dono de um serviço de alto-falantes, viu no recém-formado radiotécnico Rineu Benetti a oportunidade de aliar conhecimentos e ampliar os negócios.

Crédito foto: Divulgação | Arquivo de Carlos Gilberto Drecksler

Antonio Gonçalves da Silva no estúdio da Rádio Floresta, no início da década de 1960

Projetando trocar a pequena audiência do serviço fixo instalado nas

imediações da praça central (atual Major Nicoletti) por um veículo de maior alcance, Antonio Macaco fundou a clandestina ZYU 120, Rádio Floresta de Gramado, com potência que chegou a 500 watts.

Acostumado a dizer que em rádio nada se cria, tudo se copia, procurava inspiração na programação da Rádio Guaíba, com noticiários, música, esporte e entrevistas.

Nos primeiros meses de funcionamento, a Rádio Floresta não teve grandes problemas. Com uma programação atrativa e participação nos acontecimentos locais, começaram a surgir os primeiros anunciantes, novos compromissos com uma ainda desconfiada audiência, e havia plano de regularizar a emissora.

O maior dos desafios para a principiante Floresta foi a histórica transmissão de um jogo de futebol do Centro Esportivo Gramadense em Bom Jesus, a 120 quilômetros de Gramado. Antonio Macaco aceitou a provocação de freqüentadores de um café da cidade que desafiaram a rádio a transmitir a partida.

Negociante, o dono da Floresta anunciou a cobertura na hora e ainda cobrou cotas de patrocínio de alguns dos presentes. Nos dias seguintes, orgulhoso, creditava o feito como “mais um gol da Floresta”.

CONTRATEMPO

Um dos primeiros obstáculos na vida da Floresta surgiu quando o sócio Rineu Benetti, receoso com a legislação, resolveu vender a sua parte no negócio. Sem os 30 mil cruzeiros necessários, Antonio Macaco solicitou um empréstimo a Marcílio Cardoso, presidente do PTB de Gramado.

Foi o estopim para a oposição, atenta para o apoio da emissora ao Movimento da Legalidade, que garantira a posse do presidente João Goulart em 1961, e ao permanente espaço cedido pela Floresta para lideranças petebistas opinarem sobre política. Após denúncias anônimas, em setembro de 1962, ocorreu o primeiro fechamento da Rádio Floresta por decisão judicial.

O fundador da emissora jamais admitiu a clandestinidade da Floresta. “Clandestina não, pois tinha endereço conhecido. No máximo era ilegal”, afirmava. De qualquer forma, a rádio voltou ao ar em seguida e continuou prestando serviços comunitários. O capital da emissora foi dividido em cotas de 3 mil cruzeiros entre acionistas que aos poucos foram se desfazendo da participação.

Crédito foto: Arquivo | Carlos Gilberto Drecksler

Rádio Floresta funcionou em peça no antigo Hotel Fisch (o segundo prédio, escuro), nas imediações do atual laguinho da Praça Major Nicoletti, no Centro

Apesar da ilegalidade, órgãos municipal, estadual e federal usavam os serviços da emissora para avisos públicos, fato amplamente debatido no processo judicial, que se estendeu de 1962 a 1965. Em abril de 1964, a Rádio Floresta fechou definitivamente por questões financeiras.

Sem a Rádio Floresta, Antônio Macaco iniciou um negócio de despachante e, cerca de 30 anos depois, retomou a atividade de radialista na autorizada Rádio Excelsior de Gramado.

Dos alto-falantes nunca se separou, fazendo propaganda eleitoral periodicamente de dentro de um automóvel pelas ruas da cidade.

HOMENAGENS

Natural de São Luiz Gonzaga, Antonio Gonçalves da Silva morreu em Gramado em 1993, aos 64 anos.

O comunicador Antonio Gonçalves da Silva é nome de rua no Bairro Floresta. Sua obra, a Rádio Floresta, é nome de rua no Loteamento Altos da Viação Férrea, na Várzea Grande.

Publicado originalmente na edição nº 8, de 1998/1, página 15, da Revista Sui Generis – revista-laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) de São Leopoldo.

Fotos: arquivo do historiador Carlos Gilberto Drecksler.

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