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  • Jornal Pedaço da Vila*

Padre Mário Pizetta na cidade de São Paulo

Nascido em Gramado, no Rio Grande do Sul, Mário Pizetta deixou a casa dos pais aos 10 anos para viver no seminário. Aos 21 veio a São Paulo para prosseguir os estudos. Formado em filosofia, pedagogia e teologia, rezou a sua primeira missa aos 26, e há oito anos, chegou no pedaço para avivar a paróquia Santo Inácio de Loyola. Na entrevista a seguir, padre Mário, como é conhecido na comunidade, fala sobre a sua trajetória pela fé, explica o papel da igreja nesse momento de crise e desilusões, adianta que a paróquia será reformada, e confessa: “Não saber cantar é um dos meus pecados.”

Crédito foto: Divulgação | Pedaço da Vila

Ordenação de Mário Pizetta foi em Gramado, em 1980

Pedaço da Vila: Como começou a sua trajetória religiosa?

Mário Pizetta: Desde criança eu tinha essa vontade de participar como padre na vida da igreja. Uma vez, um sacerdote foi à minha escola para falar sobre o seu trabalho. Eu e meus amigos ficamos interessados. Em minha casa, meus pais sempre recebiam a visita de uma família que tinha um filho que estava no seminário. Ele me contava sobre sua vida e isso me entusiasmou. Eu nasci em Gramado, no Rio Grande do Sul. Aos 10 fui para o seminário em Caxias do Sul e fiquei até os meus 21 anos, onde completei o ensino médio e vim para São Paulo. Aqui me graduei em filosofia e teologia.

Pedaço da Vila: Seus pais o apoiaram?

Mário Pizetta: A minha mãe me dizia: se Deus te chamou, então vai. Já o meu pai foi um pouco resistente à minha partida. Ele não falava que era contra, mas percebíamos pelas suas atitudes. Mas, quando chegou o meu tempo de ir, os dois respeitaram a minha vontade.

Pedaço da Vila: O senhor ficou quanto tempo no seminário?

Mário Pizetta: No seminário menor eu fiquei até os meus 16 anos; depois me mudei para São Paulo para fazer o seminário maior (faculdade) e dar continuidade aos meus estudos de formação. Ao todo foram 17 anos de seminário. Aqui, me graduei em filosofia e teologia. No segundo ano de teologia, aos 26 anos de idade, eu decidi realmente que queria ser padre. Logo em seguida, eu fiquei dois anos em Roma estudando pedagogia no Salesiano.

Pedaço da Vila: E como foi a sua primeira missa?

Mário Pizetta: Foi uma emoção muito grande. A minha ordenação foi no dia 27 dezembro de 1980, no centro de Gramado, e a minha primeira missa foi na manhã seguinte na pequena capela da vilinha do seminário onde vivi. Eu tinha 28 anos. Todos os meus parentes estavam presentes. Foi lindo.

Pedaço da Vila: Quais os primeiros trabalhos que fez como sacerdote?

Mário Pizetta: Quando eu me formei padre, trabalhei como orientador no seminário menor no km 118 da Rodovia Raposo Tavares, onde morei de 1972 a 2009. Fazia o trabalho de acompanhamento vocacional dos jovens. Depois viajei todo o Brasil na orientação de jovens vocacionados. Ao voltar comecei a tomar conta das comunidades na Raposo.

Pedaço da Vila: De que maneira?

Mário Pizetta: Desenvolvendo trabalho social em três comunidades carentes do local. Por meio de mutirão, construímos muitas obras. Construímos um posto de saúde na comunidade do Jardim Santa Maria e recuperamos uma área de 50 mil m², que antes era um esgoto. E, hoje, é um parque ecológico. Foi uma das experiências mais fantásticas que vivi. Todo mundo viu que era possível sair daquela situação em que viviam. Não tínhamos dinheiro, mas todos ajudaram como podiam. No dia 30 de junho de 2016, eu recebi uma homenagem como cidadão de Osasco pelo trabalho nessa comunidade. A minha trajetória ficou dividida em três mundos: o da educação, o do trabalho social e o do mundo de ser padre.

Pedaço da Vila: Para o senhor, o que representa estar no altar?

Mário Pizetta: É uma grande honra. Quando você é padre, você ajuda os outros a crescerem e também cresce junto. O povo nos ensina muito, pois ele é muito sincero. Aprendemos juntos a compreender o outro, cada um a seu modo.

Pedaço da Vila: Como o senhor prepara as suas missas?

Mário Pizetta: Eu trago para a minha pregação um pouco de tudo o que a vida me ensina; todos somos assim. Não criamos nada de novo, apenas reaprendemos a partir dos outros. Eu chego na igreja às seis horas para começar a preparar as minhas missas. Busco sempre compartilhar uma palavra mais profunda.

Pedaço da Vila: O que é preciso para ser um bom padre?

Mário Pizetta: A primeira coisa é entender que você é padre não porque você quer ser padre, mas porque Deus te quer padre. Quando você tem essa clareza, tudo é diferente. O sacerdócio é um serviço e o que deve te manter nele não é o dinheiro, mas sim o desejo de transmitir Cristo a partir da sua própria vida. Essa maturidade é um processo longo. Nós, padres, também temos nossas vaidades e precisamos nos esforçar para eliminar essas preocupações para que a nossa ação seja clara para servir Cristo Jesus. Quando a pessoa se torna padre, abre-se diante dela uma porta muito grande. Você tem que saber onde pisa, como pisa e aprender a se relacionar com muita transparência. Do contrário, a vida irá te cobrar.

Pedaço da Vila: O senhor veio para nosso bairro em que ano?

Mário Pizetta: Eu cheguei na Vila Mariana em 2009. Primeiro trabalhei como diretor da Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação (FAPCOM) da Paulus, na Rua Major Maragliano. Fiquei ali por quatro anos. Nesse tempo conseguimos implantar a graduação em filosofia e cursos técnicos. Deixei a FAPCOM para me tornar padre da paróquia Santo Inácio de Loyola.

Pedaço da Vila: Como tem sido essa experiência como pároco da Igreja Santo Inácio de Loyola?

Mário Pizetta: É uma experiência muito diferente da que eu tive nas comunidades da Raposo Tavares. Viver a fé na periferia é diferente de vivê-la num bairro como a Vila Mariana. Lá é um ambiente de muita carência; aqui há estabilidade econômica e as pessoas não passaram por situações limites como as que conheci lá. Enquanto a religião do pobre é mais esperançosa, a de quem vive na classe média, que tem certa estabilidade, é de muita angústia, pois as pessoas não sabem até quando irão viver nessa condição. Aqui no bairro as pessoas estão passando por situações difíceis em decorrência dessa instabilidade econômica. Muitos vizinhos estão sofrendo muito. Isso está mexendo com o brio dessas pessoas. Nas comunidades as pessoas vivenciam uma religião de maior participação social. Aqui as pessoas participam, mas o envolvimento social é pequeno. Como padre, estou sempre tentando mostrar a importância da dimensão social da religião: a preocupação com o outro, a participação nos projetos para o bem da comunidade, o acolhimento. A igreja não é somente religião; ela é um espaço de despertar vidas. Não podemos ter uma visão vertical da fé.

Pedaço da Vila: Qual é o papel da igreja nesse momento de crise do país?

Mário Pizetta: A presença de Deus nos momentos de crise é sempre muito importante para nos dar discernimento e não deixar que a emoção fique acima da razão, pois, nos momentos de crise, sempre há o desespero. A oração ajuda você a buscar o equilíbrio e a encontrar soluções. O nosso papel é acolher e conscientizar de que o equilíbrio da sociedade se dá pela harmonia entre as classes sociais. O número de pessoas que batem à porta da igreja para pedir comida e dinheiro aumentou muito. Pelas ruas do bairro nos deparamos com muitas pessoas pedindo dinheiro. Diante desse cenário, todos precisamos ajudar como podemos. E essa participação está começando no bairro, o que é muito lindo e nos dá muito conforto e tranquilidade.

Pedaço da Vila: Os moradores estão mais participativos na vida da paróquia?

Mário Pizetta: Eu tenho sentido, nesses últimos três anos, que as pessoas estão mais engajadas. Isso revitaliza a vida da paróquia. Aqui não é uma paróquia voltada exclusivamente para dentro. Ela se abre para as realidades do lado de fora. Percebo que começa a despertar uma preocupação maior com outro, com o irmão que está fora e que precisa de ajuda. Nesse aspecto, os idosos são mais sensíveis. As pessoas de média e idade e os jovens também começaram a se questionar e a perceber que também podem fazer a sua parte para ajudar.

Pedaço da Vila: De que maneira esse aspecto social e participativo está sendo trabalhado?

Mário Pizetta: Numa cidade como São Paulo, não vale a pena uma paróquia ter espaço ocioso. Temos buscado meios para suprir isso e estar em comunhão com as pessoas. Aqui na paróquia acontecem muitos cursos gratuitos, como de pintura, alfabetização, atividades físicas, de bordado, de música, e cedemos o espaço para encontros de grupos de narcóticos anônimos, mulheres que amam demais... Essas atividades contínuas transformam muitas vidas sem falar de religião. A paróquia precisa ser um espaço útil para as pessoas. Também criamos um site para a paróquia, página no Facebook e boletim informativo. Estamos buscando maneiras para nos aproximarmos ainda mais da comunidade.

Pedaço da Vila: A Paróquia Santo Inácio de Loyola será reformada?

Mário Pizetta: Queremos aperfeiçoar os espaços para termos um estacionamento com 45 vagas, recuperar o salão comunitário de 250 metros quadrados e readequar as nossas salas para serem melhor utilizadas pela comunidade. Muitos frequentadores da igreja são pessoas de idade e não temos um lugar para estacionar o carro. O projeto da reforma já está concluído e será apresentado à prefeitura. Esperamos que todas as obras sejam finalizadas em dois anos. Para isso, queremos mobilizar a comunidade para ajudar.

*Texto publicado em outubro de 2017 no Jornal Pedaço da Vila (Vila Mariana, São Paulo) e reproduzido aqui integralmente, com autorização da editora, Denise Delfim.

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